domingo, 22 de fevereiro de 2015

Numa paisagem, outra

o unguento e, às vezes,
a colônia de morte,
sangram através do pensamento, lâmina
que toca a jugular

se animal em pelo, se apenas
recipiente,
quem saberá? enquanto se esgueiram
refazem os modos de si

alguém que os interpreta
há muito não goza de confiança
por isso, os gritos
com que intenta mover as pedras

quem contesta o descendente
e as razões
que o fazem irmão da gazela
inimigo da febre?

não seremos nós, os que portam
a camisa sem idiomas,
nem as mulheres
a quem reservam o teto da casa
e nenhuma epígrafe

a contestação faz-se por si mesma
a jugular não se entrega ao braço
que desfere o golpe
e se esgota nesse gesto

não, o sacrifício não está no mel
que incendeia, de tempos em tempos,
a viagem dos parentes

as ondas que mudam por si mesmas
disseram adeus às certezas,
nós ainda não
(pelo menos aqueles que se julgam
primo dos primeiros)

como nos enfrentaremos sob a ordem
que tropeça?
mil sendas se abrem e a seiva do pai,
como o recém-nascido,
se perdeu num corpo maior

ninguém está lá, a não ser
quem te conhece e estranha, não
o charme de irmão,
não espere entendimento se ele fizer
um círculo na areia

não há cortes que expliquem
a paisagem anterior, nem a sombra, amanhã,
nos caules

o que se espraia da jugular
é um labirinto que conduz a outro e se algum
vestígio resta
é para dizer seu afastamento da origem

as leituras faliram
se o descendente insiste,
rasga os seres para os quais não temos
saúde

nesse deserto de alegrias, a herança
é o animal que saqueia o verbo
antes do sacrifício

(Edimilson de Almeida Pereira)

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